EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR MINISTRO PRESIDENTE DO COLENDO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
_______________________________________, Defensor Público do Estado de São Paulo, vem, respeitosamente, perante Vossa Excelência, com fundamento no artigo 5º, inciso LXVIII da Constituição Federal e artigos 647 e seguintes do Código de Processo Penal, impetrar a presente ordem de
HABEAS CORPUS
em favor de ____________________________, brasileiro, nascido em ____________, filho de ____________________________________________________, natural de ___________/____, que sofre constrangimento ilegal por ato da _____Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça do Estado de ____________, nos autos do RECURSO DE APELAÇÃO n. ______________________ (autos originais n. ______________ – ___ Vara Criminal da Comarca de _____________________) em conformidade com as razões de fato e de direito adiante aduzidas.
I – do cabimento do writ
A Constituição Federal no artigo 5º, inciso LXVIII e o Código de Processo Penal em seu artigo 647 prevêem a possibilidade se impetrar habeas corpus toda vez que alguém sofre ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção.
O remédio constitucional garante a efetividade do direito de locomoção nos termos do artigo 5º, inciso XV da Constituição Federal.
Salienta-se que a ameaça ao direito de locomoção abrange qualquer ordem que implique em privação da liberdade do indivíduo. Nesse sentido a lição de Nestor Távora e Rosmar Rodrigues Alencar:
“Daí que a liberdade de locomoção é assegurada até mesmo em perspectiva, ou seja, a impetração do habeas corpus é admitida quando o inquérito ou o processo penal vise à apuração de delito que tenha cominação em abstrato, dentre suas penas previstas, de privação de liberdade.” (Curso de Direito Processual Penal, 5ª Ed., Editora Juspdivm, 2011, pág. 1.047).
No presente caso, o paciente foi condenado às penas de 28 (vinte e oito) anos de reclusão, mais o pagamento de 15 (quinze) dias-multa, como incurso no artigo 157, § 3º, segunda parte, cumulado com o artigo 61, II, alínea “h” do Código Penal, contudo, a dosimetria da pena não foi aplicada adequadamente.
É notório que o recurso ordinário demandará excessivo tempo para apreciação, considerando-se as fases de interposição, arrazoamento, instrução, decisão de recebimento, contrarrazões, remessa à superior instância, distribuição, parecer do Ministério Público e julgamento – tudo a agravar ainda mais o sagrado direito constitucional amparado pelo Habeas Corpus.
Alexis Couto de Brito ensina que:
“Sempre relembramos que a ineficiência do Estado não poderá ser transferida ao cidadão, ainda que este seja um condenado. [...]. Concordando com este argumento Roberto Gomes Lima e Ubiracyr Peralles mudaram seu entendimento anterior para considerar que a mora ou ineficiência do Estado constituirá constrangimento ilegal, sempre que o condenado ficar a mercê da Justiça por mais tempo do que determina a lei penal ou processual (Teoria e prática da execução penal. P. 49)”. (Execução Penal/Alexis Couto de Brito – 2ª Ed. Rev. Ampl. e Atual.- São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011).
Noutro lado, pontua-se que a inadequação da via eleita não desobriga esse Colendo Superior Tribunal de Justiça fazer cessar de ofício, manifesta ilegalidade no direito de ir e vir do paciente, a fim de se atingir a finalidade do writ.
Daí o cabimento do presente writ.
II- DOS FATOS
O paciente foi denunciado como incurso no artigo 157, § 3º, segunda parte, cumulado com os artigos 29 e 61, inciso II, alíneas “d” e “h”, todos do Código Penal, porque, no dia ______________________, por volta das ______________, na _________________________________, em concurso de agentes e, mediante grave ameaça física exercida com emprego de duas armas de fogo contra as vítimas _____________________________________, teriam subtraído cerca de U$ 3.700,00 (três mil e setecentos dólares americanos), U$1.350,00 (um mil trezentos e cinquenta dólares americanos) em cheques de viagem e R$250,00 (duzentos e cinquenta reais) em moeda corrente, sendo que da violência resultou a morte da vítima_____________________.
Ao final da instrução criminal, o ínclito magistrado de primeira instância condenou o paciente ___________________________ às penas de 28 (vinte e oito) anos de reclusão, mais o pagamento de 15 (quinze) dias-multa, como incurso no artigo 157, § 3º, segunda parte, cumulado com o artigo 61, II, alínea “h” do Código Penal; o corréu _____________________________ às penas de 23 (vinte e três) anos e 04 (quatro) meses de reclusão, mais o pagamento de 11 (onze) dias-multa, com início em regime fechado, como incurso no artigo 157, § 3º, segunda parte, cumulado com o artigo 61, II, alínea “h” do Código Penal e corréu ___________________________ às penas de penas de 28 (vinte e oito) anos de reclusão, mais o pagamento de 14 (quatorze) dias-multa, como incurso no artigo 157, § 3º, segunda parte, cumulado com o artigo 61, II, alínea “h” do Código Penal.
Irresignado com a r. sentença, o paciente interpôs recurso de apelação.
Em 22 de fevereiro de 2010, a ______Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de ________________ negou provimento ao recurso interposto.
III – do direito
1)DA FIXAÇÃO DA PENA BASE NO PATAMAR MÍNIMO
O ato da autoridade coatora encontra-se revestido de ilegalidade, pois estabeleceu a pena-base do paciente em 28 (vinte e oito) anos de reclusão.
Ao fixar a pena base do paciente o órgão julgador a quo, afirmou que (vide fl. 566):
“haja vista sua personalidade fria insensível, ceifando a vida de uma mulher casada, na presença do marido e das duas filhas ainda crianças, fazendo desmoronar uma família unida por causa de alguns dólares, fixo a pena-base em 28 (vinte e oito) anos de reclusão e 15 (quinze) dias multa...”.
Entretanto, o nobre julgador não fez menção à primariedade do paciente e à sua menoridade, que nos termos do artigo 59 do Código Penal devem ser sopesadas na aplicação da pena.
O nobre julgador levou em consideração o fato de o crime ter sido praticado na presença do marido e das filhas da vítima. Ocorre que no presente caso também foi considerada a agravante prevista no artigo 61, inciso II, alínea “h”.
É certo que as circunstâncias do artigo 59 do Código Penal podem surgir como agravantes e atenuantes, porém, nestes casos só podem ser utilizadas na segunda fase de aplicação da pena. Nesse sentido a súmula 241 desse Colendo Superior Tribunal de Justiça:
“A reincidência penal não pode ser considerada como circunstância agravante e, simultaneamente, como circunstância judicial.”
Por outro lado, a fundamentação do aumento da pena base na “personalidade fria insensível” do paciente configura a adoção do “direito penal do autor”, pois pune o agente pela ameaça/perigo que ele representa à sociedade e não pelo fato por ele praticado.
Ora, a adoção do “direito penal do autor” não é compatível com estado democrático de direito, pois fere o princípio da dignidade da pessoa humana bem como a tutela das liberdades individuais.
O agente deve ser punido pelo fato, não pela sua personalidade. A propósito, confira-se a lição de Eugenio Raúl Zafaroni e José Henrique Pierangeli[1]:
“Seja qual for a perspectiva a partir da qual se queira fundamentar o direito penal de autor (culpabilidade de autor ou periculosidade), o certo é que um direito que reconheça, mas que também respeite a autonomia moral da pessoa, jamais pode penalizar o ‘ser’ de uma pessoa, mas somente o seu agir, já que o direito é uma ordem reguladora de conduta humana. Não se pode penalizar um homem por ser como escolheu ser, sem que isso violente a sua esfera de autodeterminação.”
Salienta-se que para o delito previsto no artigo 157, parágrafo 3º, segunda parte do Código Penal é prevista a pena de 20 (vinte) a 30 (trinta) anos e no presente caso a pena-base foi fixada em 28 (vinte e oito) anos, muito próxima da pena máxima em abstrato.
2) DA PREPONDERâNCIA DA ATENUANTE DA MENORIDADE sobre a agravante
Na segunda fase de aplicação da pena do paciente a atenuante da menoridade foi compensada com a agravante prevista no artigo 61, inciso II, letra “h” do Código Penal.
Ocorre que, a atenuante da menoridade deve preponderar sobre as demais circunstâncias agravantes.
Vale colacionar o seguinte julgado sobre o tema:
“Habeas Corpus – Roubo qualificado – Fixação da pena-base – Exacerbação injustificada – Nulidade – Atenuante da menoridade – Preponderância sobre as demais circunstâncias, inclusive, sobre os maus antecedentes. 1. O julgador deve, ao individualizar a pena, examinar com acuidade os elementos que dizem respeito ao fato, obedecidos e sopesados todos os critérios estabelecidos no art. 59 do Código Penal, para aplicar, de forma justa e fundamentada, a reprimenda que seja, proporcionalmente, necessária e suficiente para reprovação do crime. 2. A atenuante da menoridade deve preponderar sobre qualquer outra circunstância, inclusive sobre a reincidência, por sua vez mais gravosa que os maus antecedentes, sob pena de malferimento ao princípio da individualização da pena. 3. Ordem concedida tão somente para, mantida a condenação, reformar a sentença e o acórdão na parte relativa à dosimetria da pena, nos termos explicitados no voto. (STJ-HC 33919 – 2004/0023390-4/SP – 5ª T. – Rel. Min. Laurita Vaz – DJ. 07.03.2005 – p. 290). (grifo nosso).
Destarte, a decisão da autoridade coatora deve ser revista a fim de aplicar a atenuante da menoridade com preponderância sobre a agravante prevista no artigo 61, inciso II, letra “h” do Código Penal, na 2ª fase de aplicação da pena.
3) DA APLICAÇÃO DA ATENUANTE DA CONFISSÃO
Conforme se verifica dos autos, tanto na fase policial quanto no interrogatório judicial o paciente confessou a prática do fato, assumindo a autoria (vide documentos em anexo).
Aponta-se que o paciente participou ativamente da reconstituição dos fatos.
Entretanto, ao aplicar a pena o ínclito magistrado não considerou a atenuante da confissão.
Constou da sentença:
“Isso é o que a prova dos autos indica, levando-se em conta, em especial as próprias confissões dos réus, que na fase indiciária, com minúcias e riqueza de detalhes, contaram como tudo ocorreu, desde o início do planejamento até a consumação do latrocínio (fls. 190/192, 232,234, 255/258 e 271/273), tudo fazendo na presença de seus advogados, garantindo assim a lisura dos atos.
[...]
Em juízo, _______ voltou a confessar, agora parcialmente...”
Deste modo, embora não tenham confessado plenamente em juízo, ou tenha havido retratação parcial da confissão em juízo, a atenuante deveria ter sido aplicada, posto que o julgador a quo fundamentou sua decisão na confissão do paciente.
Aliás, mesmo que tivesse se retratado totalmente da confissão realizada na fase policial, ainda faria jus à aplicação da atenuante posto que a confissão foi utilizada para fundamentar a sentença condenatória.
Nesse sentido a jurisprudência desse Colendo Superior Tribunal de Justiça:
“PENAL E PROCESSO PENAL. RECURSO ESPECIAL. OFENSA AO ART. 59 DO CP. OCORRÊNCIA. MAUS ANTECEDENTES E REINCIDÊNCIA VALORADOS DIANTE DA MESMA OCORRÊNCIA. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 241/STJ. AÇÕES EM CURSO CONSIDERADAS COMO MAUS ANTECEDENTES, CONDUTA SOCIAL DESREGRADA E PERSONALIDADE NEGATIVA. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 444/STJ. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS CONCRETOS APTOS A LASTREAR A CONSIDERAÇÃO DAS CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS COMO DESFAVORÁVEIS. DADOS INERENTES AO TIPO PENAL. FUNDAMENTAÇÃO INIDÔNEA. VIOLAÇÃO AO ART. 65, III, D, DO CP. OCORRÊNCIA. CONFISSÃO EXTRAJUDICIAL RETRATADA EM JUÍZO. EFETIVA UTILIZAÇÃO NA SENTENÇA CONDENATÓRIA COMO PARTE DA FUNDAMENTAÇÃO. INCIDÊNCIA DA ATENUANTE QUE SE FAZ IMPERATIVA. COMPENSAÇÃO COM A REINCIDÊNCIA. POSSIBILIDADE. CIRCUNSTÂNCIAS PREPONDERANTES DO ART. 67 DO CP. RECURSO ESPECIAL A QUE SE DÁ PROVIMENTO. CONSEQUENTE OCORRÊNCIA DA PRESCRIÇÃO. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE QUE SE DECLARA. 1. Esta Corte, em regra, não analisa eventual violação ao artigo 59 do Código Penal, por esbarrar na vedação do enunciado nº 7 da Súmula deste Superior Tribunal de Justiça. Mister, no entanto, analisar mencionada ofensa quando a fundamentação da dosimetria se lastreia, equivocadamente, em elementos abstratos, em dados do próprio tipo penal ou levando em consideração fatos já considerados pela jurisprudência dos Tribunais Superiores como inidôneos, não implicando, nestes casos em reexame de fatos e provas. 2. Não pode um mesmo fato da folha de antecedentes penais do acusado ser considerado em dois momentos da dosimetria da pena, ou seja, como maus antecedentes e, posteriormente, como reincidência, sob pena de bis in idem. Inteligência do enunciado 241 da Súmula desta Corte. 3. Segundo entendimento sumulado deste Superior Tribunal de Justiça, não podem ser valorados de forma negativa os antecedentes, a conduta social ou a personalidade do réu, em razão da existência de inquéritos policiais e ações penais em curso, haja vista o princípioconstitucional da presunção de inocência (Súmula 444/STJ). 4. Para elevação da pena-base acima do mínimo legal, devem ser trazidos elementos concretos, não se prestando para tanto os dados do próprio tipo penal ou argumentos negativos relativo ao réu sem demonstração nos autos. 5. Deve ser reconhecida a atenuante da confissão espontânea, prevista no artigo 65, inciso III, alínea d, do Código Penal, ainda que haja retratação em juízo, quando o juiz se vale dela para formar seu convencimento. 6. A Sexta Turma desta Corte tem entendido que a atenuante da confissão espontânea, por envolver a personalidade do agente, também é preponderante, nos termos do artigo 67 do Código Penal, devendo, portanto, ser compensada com a agravante da reincidência. 7. Recurso especial a que se dá provimento, para reconhecer a violação aos artigos 59 e 65, inciso III, alínea d, do Código Penal, redimensionando, dessa forma, a pena do recorrente e, consequentemente, declarando a extinção da punibilidade, pela prescrição da pretensão punitiva do Estado com base na pena aplicada em concreto, nos termos dos artigos 107, inciso IV, combinado com o artigo 109, inciso V, ambos do Código Penal”. (REsp 1094485 / MS, Relator(a) Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, Sexta Turma, j. 03/11/2011, DJe 17/11/2011).
Destarte, imperiosa se faz a reforma do julgado a fim de fazer incidir a atenuante da confissão, reduzindo-se em 1/6 (um sexto) a pena imposta.
III - DO PEDIDO
Por todo exposto, requer a concessão da ordem a fim de que seja determinada a reforma do julgado a fim de:
a) fixar a pena-base do paciente no seu patamar mínimo -20 anos de reclusão – ou, subsidiariamente, a aplicação da atenuante da menoridade como preponderante sobre a agravante prevista no artigo 61, inciso II, alínea “h” do Código Penal, reduzindo-se a pena do paciente em 1/6 (um sexto).
b) aplicar a atenuante da confissão, reduzindo-se em 1/6 (um sexto) a pena imposta ao paciente.
Local e data.
- Defensor Público do Estado
[1] Zaffaroni, Eugenio Raúl. Manual de Direito Penal Brasileiro, vol. I: parte geral. 8ª ed. rev. e atual. – São Paulo: Editora RT, 2009, pág. 107.
Defensora Pública do Estado de São Paulo. Formada na Fundação de Ensino "EURÍPEDES SOARES DA ROCHA". Faculdade de Direito de Marília - SP em 1996. Fundação de Ensino "EURÍPEDES SOARES DA ROCHA" Faculdade de Direito de Marília - SP. Pós Graduação "Lato Sensu" em Processo Civil - 2000-2001. Complexo Educacional Damásio de Jesus - Unidade Araçatuba/sp - Pós Graduação "Lato Sensu" em Direito Penal - 2012-2013.<br>
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: LIMA, Andrea da Silva. Habeas Corpus impetrado no STJ para fixação da pena base no mínimo, preponderância da atenuante da menoridade sobre a Agravante ou subsidiariamente a aplicação da atenuante da confissão Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 29 dez 2016, 04:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Peças Jurídicas/48499/habeas-corpus-impetrado-no-stj-para-fixacao-da-pena-base-no-minimo-preponderancia-da-atenuante-da-menoridade-sobre-a-agravante-ou-subsidiariamente-a-aplicacao-da-atenuante-da-confissao. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: Conteúdo Jurídico
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